Pular para o conteúdo principal

Direito de propriedade não decorre de registro paroquial


Não há direito de propriedade decorrente do registro paroquial, assim como, para legitimar posse de lote de terra, é necessário, além da medição do imóvel, o cultivo, a moradia habitual do respectivo posseiro e as demais condições explicitadas na Lei de Terras de 1850. O entendimento é da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao julgar questão em que o ocupante da Ilha do João da Cunha, localizada no município de Porto Belo (SC), requeria que lhe fosse reconhecido o domínio pleno sobre o imóvel para isentar-se do pagamento anual da taxa de aforamento.

Segundo os autos, o autor da ação alega ser o proprietário da ilha desde 16/4/1953, conforme escritura pública de compra e venda, passada em cartório e registrada no Registro de Imóvel. Em junho de 1990, julgando abusiva a taxa de aforamento cobrada anualmente sobre o imóvel, encaminhou petição à Delegacia do Patrimônio da União do estado para que houvesse o reconhecimento do domínio pleno sobre a ilha e, por consequência, a exoneração quanto ao pagamento do imposto.

O pedido foi indeferido no âmbito administrativo, pois não estava provada a cadeia sucessória e a alienação das terras pela União. O órgão superior manteve a decisão e acrescentou que o registro feito por João da Cunha, primeiro proprietário da ilha, no livro do vigário em Porto Belo para legitimar a propriedade era um simples cadastro. O ocupante da área recorreu alegando que a Lei de Terras (Lei 601 de 18 de setembro de 1850) legitimou a posse de João da Cunha sobre a terra em litígio e que ele teria levado o imóvel ao registro paroquial, o qual, segundo o autor da ação, comprova a titularidade do domínio.

O juízo da 4ª Vara da Circunscrição Judiciária de Florianópolis julgou improcedente o pedido. O ocupante da ilha recorreu ao STJ, alegando que houve violação da Lei de Terras, uma vez que, em seu artigo 7º, a exigência de medição destinava-se apenas às terras continentais se compatível com os recursos da época. Sustenta, ainda, que o registro paroquial valida o registro de propriedade e não tem caráter meramente cadastral ou estatístico.

O voto

A Quarta Turma, por unanimidade, não acolheu o recurso especial, seguindo as considerações do relator, ministro Luis Felipe Salomão. Ele afirmou que a cadeia dominial do imóvel não é completa porque haveria nos autos apenas indícios de que João da Cunha tentou proceder à legitimação de sua posse. Concluiu também que o registro paroquial carece de força oponível à determinação do legislador e não tem o poder de atribuir o domínio ao ocupante da terra, pois não confere à publicidade inerente aos registros imobiliários.

O relator destacou que a origem das propriedades particulares no Brasil parte das doações de sesmarias e de ocupações primárias. Portanto, para se transformar em domínio pleno, deveriam essas terras passar por uma revalidação ou legitimação, conforme previsto na Lei de Terras. Ressaltou que, para tal legalização, seria necessário, além da medição, o cultivo da terra, a moradia habitual do respectivo posseiro, bem como as demais condições exigidas no artigo 5º da lei em análise.

Quanto à questão de o registro paroquial dar direito de propriedade, o ministro Luis Felipe Salomão salientou que, por qualquer ângulo que se analise a questão, seja considerando-o apenas como cadastro estatístico ou simplesmente meio de prova do fato da posse, não há como lhe conferir o alcance pretendido, pois esse registro não tem a virtualidade de completar a cadeia dominial, viciada desde a origem.

Fonte: Coordenadoria de Editoria e Imprensa - STJ

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Não comprovada fraude, deve ser respeitada a meação do cônjuge

Não comprovada a ocorrência de fraude, deve ser respeitada a meação prevista na sentença homologatória da dissolução da sociedade conjugal. Assim decidiu a 1ª Câmara do TRT da 15ª ao negar provimento a Agravo de Petição, tentando modificar sentença da Vara do Trabalho de Lorena, no Vale do Paraíba. O agravante é o espólio do cônjuge varão. A primeira instância havia julgado procedente em parte Embargos de Terceiro, liberando a penhora, correspondente a favor da agravada. O agravante insistia na penhora total do crédito, relativo à venda do imóvel. Segundo ele, não deveria prevalecer a meação da separação conjugal, objeto de acordo judicial, em face da invalidade dos documentos oferecidos como prova, pois não estariam revestidos das formalidades legais. Alegava, ainda, que a dívida trabalhista inseria-se na cláusula do acordo para dissolução da sociedade conjugal que recai sobre o imóvel, a ser suportado pelo cônjuge varão, tendo a agravada se beneficiado dos serviços prestados pelo Agr

Testamento público: publicidade equivocada

Por LUCAS DE ARRUDA SERRA O Testamento Público lavrado por Tabelião de Notas a primeira vista parece que por ser “Público” pode qualquer pessoa ter acesso ao mesmo. É público afinal?! Na verdade o Testamento Público é chamado de público por ser lavrado por Oficial público em seu livro Notas, e não que esteja à disposição de toda e qualquer pessoa que queira ter acesso as disposições de última vontade do testador. Maria Helena Diniz, ensina: “Não deve, pois, só porque chamado de `público´, ficar aberto, permitindo-se o seu acesso a qualquer pessoa” (Curso de Direito Civil Brasileiro, 6. Direito das Sucessões, 21ª edição-2007, pag. 203). O testamento é feito para ter efeito após a morte do testador e o seu prévio conhecimento pode causar alguns transtornos àquele que testou, não sendo prudente permitir que qualquer pessoa possa solicitar certidão e obtê-la, sem, no entanto, comprovar o óbito daquele que testou. O acesso enquanto vivo o testador pode ser permitido a ele mesmo ou a qualque

Integralização ou desincorporação de bens imóveis por instrumento público

Por Viviane Souza Vieira Dispõe o artigo 64 da Lei 8.934/94 acerca do Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins, nos seguintes termos: Art. 64 A certidão dos atos de constituição e de alteração de sociedades mercantis, passada pelas juntas comerciais em que foram arquivados, será o documento hábil para a transferência, por transcrição no registro público competente, dos bens com que o subscritor tiver contribuído para a formação ou aumento do capital social. O Oficial de Registro de Imóveis analisa 8 hipóteses ante o registro da integralização ou desincorporação de bens imóveis (transferência de imóvel entre o sócio e a sociedade): 1. formação de capital social de sociedade registrada na Junta Comercial; 2. aumento de capital social de sociedade registrada na Junta Comercial; 3. redução de capital social de sociedade registrada na Junta Comercial; 4. extinção de capital social de sociedade registrada na Junta Comercial.; 5. formação de capital social de sociedade regist